A INTERNET PARA VOCÊ É TV OU BIBLIOTECA?

Gosto dos diálogos comuns, em que as pessoas conversam entre si em tempo real. Somente estas pessoas que estão presentes interagem, trocam e convivem. Há conexão entre elas, relacionamentos que passam por fases e uma comunicação que vem de dentro destas pessoas. Como interferência pode haver um parente curioso escutando atrás da porta, uma sirene na rua, uma criança que chega correndo, a campainha que toca ou o gato pedindo colo. Uma delas está em uma pirâmide e quer te levar junto, outra te interrompe para falar ansiosamente sobre problemas de um relacionamento, sempre tem a que quer te converter para a religião dela ou descrever o filme que acabou de assistir.

Tudo isso vem de fora, mas de certa forma faz parte da vida das pessoas que estão ali presentes e envolve outras pessoas. E quando envolve robôs, algoritmos e instituições gigantescas e poderosas que colocam seus interesses comerciais acima de tudo? Ainda estamos aprendendo a lidar com isso e deveríamos ter pressa.

Sinto falta de estarmos presentes nas situações importantes da vida real, vivendo de fato, conscientes do que está acontecendo. Contato com a natureza, momentos ricos em estímulos aos cinco sentidos, experiências que nos preenchem e nos levam a evoluir, assuntos discutidos em profundidade, descanso verdadeiro. Às vezes desperdiçamos esse tipo de coisa por estarmos constantemente distraídos e em estado letárgico rolando telas, pulando compulsivamente de uma foto para outra, interrompendo um trabalho para ver uma notificação fútil. Seria melhor virarmos páginas de um bom livro que escolhemos, vermos menos detalhes da vida alheia, trabalharmos com mais foco, sermos interrompidos só por quem permitimos.

Grandes empresas nos conhecem melhor do que nós mesmos (também ganham da mãe e da terapeuta), são capazes de prever nosso comportamento, influenciar nossas opiniões e vender nossos dados. Os robôs são rápidos, contam com recursos tecnológicos avançados e grande capacidade de armazenamento. E quem os programa e controla são pessoas que deveriam ser responsabilizadas pelos seus atos.

Se você assistiu documentários como Dilema das Redes, Privacidade Hackeada, A Era dos Dados – Monitoramento e lembrou-se do que só tinha visto em filmes de espionagem ou de ditadura, sabe que o nível de vigilância atual é profundamente invasivo. Dá menos trabalho esconder as câmeras e microfones, porque já estão por toda parte nos sistemas de segurança e nos celulares. Nós estamos vendo e ouvindo o conteúdo das telas e nos esquecemos que estamos sendo vistos, ouvidos e monitorados até quanto tempo passamos em cada tela.

Isso se acentua cada vez que você recusa um serviço pago e ignora os altos custos que uma empresa tem; pagando você reduz as chances dela ter que vender os seus dados (ainda os usará em proveito próprio). Você facilita isso entrando em diversos sites e aceitando políticas de privacidade sem ler, preenchendo todos os formulários de sorteio, compartilhando cada passo seu ou lendo notícias através das redes sociais.

“Então não posso relaxar e usar o celular para espantar o tédio ou a solidão?” Sempre que faz isso, você está se entregando a ser controlado, manipulado e influenciado. Principalmente induzido a gastar o máximo de tempo online e gastar o máximo de dinheiro possível. Você está se fechando na bolha de conhecimento que te mostra mais do mesmo e te deixa mais vulnerável a boatos, polarização e teorias da conspiração. Você também é bombardeado com as coisas que o anunciante pagou para você ver através da empresa que te conhece como ninguém. Quanto mais você aceita sugestões de conteúdo, mais você assume uma postura passiva como fazia ao sentar-se diante da tv, só que agora pior por ser personalizada. Você será incentivado a se comparar a outras pessoas, a usar filtros e maquiar sua realidade, te levando a sentir-se mal.

Se a nossa atenção é o foco destas grandes empresas, por que não é o nosso foco? Elas nos lembram que a atenção está ligada ao tempo e ao dinheiro, devemos direcioná-la ativamente para as coisas certas. Se as grandes empresas se dedicam tanto a conhecer nossas emoções e comportamento, por que não fazemos isso todos os dias? Se alguém disposto a nos viciar sugere algo, não seria inteligente observar, questionar ou recusar? A privacidade e os direitos a escolher com quem compartilhar nossos dados e em que circunstâncias deveria ser o normal. A publicidade pode acontecer, mas de maneira honesta, transparente e não o tempo todo.

Se a Internet é uma fonte inesgotável de conhecimento, busquemos os cursos, as leituras, os vídeos que agregam. Como uma biblioteca, que você escolhe com quem se sentar e que horas entra e sai. Se as redes sociais reúnem pessoas de vários tipos, por que não nos conectar com quem nos faz bem e ouvir os diferentes que nos façam refletir e expandir nossos horizontes? Se os grupos virtuais permitem trocar ideias e depoimentos com pessoas de diversas localidades, vamos nos unir em torno de interesses ou problemas em comum. Cabe a cada um de nós colocar limites de tempo, horário e tipo de coisa que nos atrapalha. Podemos criar conteúdo em vez de somente consumir, como estou fazendo aqui.

Andréa Voûte

As emoções são cavalos selvagens. Para que domar?

A frase que eu mais gosto para definir as emoções é que elas são cavalos selvagens.  Uma das características mais interessantes dos cavalos é justamente que nunca deixam de ser selvagens em sua essência, mesmo os mais “mansos” não podem ser completamente dominados.  Vamos imaginar então que cada uma de suas emoções seja um cavalo selvagem. 

Ignorá-lo poderia resultar em mordidas ou coices, entre outros prejuízos imprevisíveis gerados por negar que ele está ali.  Você pode tratar cada cavalo com o carinho e respeito que todos merecem, mesmo os mais difíceis de lidar, afinal ele é “seu” ou, na verdade, está sob a sua responsabilidade.  Cada emoção que você sente faz parte de você e deve ser conhecida e aceita, lide com ela de forma consciente. Ouça o cavalo, observe como ele realmente é para que possa entendê-lo bem.

Logo você começaria a domar este cavalo, sempre com gentileza e paciência, lembre-se que há vários métodos de doma e alguns criam traumas. Um dia finalmente se estabeleceria um bom relacionamento, em que você seria a autoridade, com as rédeas nas mãos.  O roteiro do passeio e a velocidade seriam escolhas suas, passo calmo para descansar e apreciar a paisagem ou delirante galope ao vento…  Não vale perder a gentileza depois de montar, o respeito deve continuar, até porque o cavalo sabe instintivamente de coisas que você não sabe.  Não forçarias o cavalo e ele não te derrubaria propositalmente, mas ainda assim procurarias aprender a cair caso isso acontecesse.  Terias sempre em mente que o animal é dotado de instintos e sentidos bem aguçados, pode avisar-te de perigos escondidos. Lembrarias de deixá-lo correr solto eventualmente, sentindo o prazer de admirar a força e o vigor da natureza. 

Quais são os cavalos selvagens que você tem a domar que estão afetando sua vida financeira mais diretamente? Medos exacerbados de perder dinheiro, o emprego ou o cliente?  Preocupação constante em ser roubado ou enganado?  Pânico diante do novo e da velocidade das mudanças?  Carência doentia de atenção, afeto ou poder que te leva a gastar muito mais do que deveria?  Ansiedade descontrolada que não te permite esperar nem um dia a mais e te enterra em lamaçais de dívidas?  Culpa por ser próspero/a, dúvidas torturantes sobre ser merecedor de riquezas que as mantém longe e inacessíveis?  Aversão ao capitalismo ou ao lucro que inviabiliza o seu negócio?  Euforia e excesso de confiança que causaram a sua quebra no mercado de risco? Quantas vezes você paralisou ou se atrasou em coisas importantes por medos que nunca chegam a se concretizar e probabilidades que nem eram tão altas?  Quantos inimigos gerou a ambição desmedida que atropela e derruba tudo para chegar aonde quer, alimentada por insaciáveis desejos a realizar urgentemente?  Às vezes basta um cavalo nervoso para prejudicar todos os outros.

Não vejo como ter sucesso nas finanças enquanto houver pendências emocionais sérias.  Ao atingir um equilíbrio, você terá o entusiasmo de quem realizou alguns sonhos e pode sonhar mais.  Perfeito? Não, o imperfeito sob controle.  Viverá a plenitude de sua saúde financeira, investindo com riscos calculados, empreendendo com mais confiança, experimentando a alegria de doar, buscando as oportunidades certas, em um estilo de vida que te proporcione emoções agradáveis. 

Para onde os seus impulsos estão te levando?

Adiar a gratificação é um dos segredos do sucesso, comprovado por um famoso estudo da universidade Stanford com crianças de 4 anos: elas ficaram sozinhas em uma sala com um marshmallow, sabendo que se conseguissem esperar 15 minutos para comê-lo, ganhariam mais um e depois poderiam comer os dois. Apenas 1/3 das crianças resistiu à tentação e elas obtiveram 100% de retorno pelo sacrifício de esperar 15 minutos, ou seja, “patrimônio” dobrado. Quando foram verificar a vida dessas crianças quinze anos depois, todas estavam melhor nos estudos e na vida em geral, enquanto os outros jovens eram problemáticos. Ter a paciência de esperar e a disciplina de pensar mais no resultado do que no prazer imediato impacta o futuro mais do que QI e mais do que nível socioeconômico dos seus pais.

Ser impulsivo e inconsequente custa caro. Muitos dos piores gastos dos quais nos arrependemos são decididos nos primeiros segundos e os vendedores sabem disto. Espere pelo menos 24 horas para gastar, observe se a motivação é o medo de não ter aquilo de novo ou o prazer da compra em si, pense se você pode pagar. Cuidado com o impulso de levar vantagem, mentir ou assumir um compromisso que já sabe que não conseguirá cumprir. Cultive a compaixão para não explorar o outro e desenvolva a esperteza para evitar ser enganado. Escolha bem o conteúdo que você lê e assiste, seja seletivo em suas companhias e no lazer.

Alguns negócios desastrosos que quebram uma empresa são fechados no calor do momento e bons negócios são recusados sem pensar direito. É só olhar à nossa volta para constatar que ter objetivos, planejar e executar corretamente dá resultado positivo nas finanças. Projetos bem-sucedidos e negócios de sucesso demandam planejamento sério, competência, muito trabalho, preparação, investimento de dinheiro e tempo para dar lucro. E o sucesso traz prazer também, mais sólido e duradouro; depois que você se supera sente-se muito bem. O prazer imediato é infantil e egoísta, enquanto a felicidade é generosa.

Ser atropelado pelos fatos e reagir a eles é bem diferente de agir e conduzir os acontecimentos. Falar e agir sem pensar costuma trazer problemas na esfera pessoal, acadêmica ou profissional, e afeta especialmente os relacionamentos. Prevenir-se contra imprevistos desfavoráveis tranquiliza e eles serão absorvidos naturalmente. Preparar-se para boas surpresas nos torna aptos a aproveitar melhor as oportunidades quando elas surgirem. Precisamos da inteligência emocional e do autocontrole e isso não quer dizer reprimir as emoções.

Perdeu dinheiro? Estude como recuperá-lo. Perdeu o controle? Retome e não prolongue a bagunça. Só não podemos exagerar e passar todo o tempo planejando, é preciso agir e colocar em prática o que foi planejado. A função maior do planejamento é saber qual a coisa certa a fazer, quando, como e onde. Se não houver ação, ele perdeu a finalidade. Se você se perder nos detalhes, talvez não dê tempo de executar — atualmente tudo acontece muito rápido. Tornar-se obcecado por controle não é saudável e nem realista. Resista aos impulsos, mas saiba diferenciá-los de uma intuição, um instinto verdadeiro. Viva bem o presente, lembrando-se de considerar o futuro.

Andréa Voûte

foto de Tommaso Fornoni para Unsplash